quando eu entrei na faculdade, com 17 anos, um professor perguntou, em uma de minhas primeiras aulas, quem tinha menos de 18 anos. só eu levantei a mão, para minha surpresa. ele então, dirigindo-se para toda a sala, mas me usando como exemplo, disse:
"pascal inventou a calculadora quando tinha 19 anos. você ainda tem pelo menos 2 anos para criar alguma coisa que vai impactar a humanidade."
não preciso dizer que, desde então, uma terrível sensação de incompletude me acompanha em minha jornada terrestre. na verdade, pela marítima, fluvial e aérea também. me pego sempre pensando no que mais eu poderia estar fazendo para tentar deixar uma marca nessa bola gigante que flutua no cosmo. pode ser complexo de golias, ou de davi. pode ser o complexo de golgi que tá falhando, não sei. só compreendo que em minha infinita finitude humana, entre um acordar cedo fazendo coisas ou dormir tarde fazendo ainda outras coisas, meio que me perco numa neblina de propósito.
a gente tá atravessando um período complicado enquanto união de capitanias hereditárias (acho que mudou o nome já, não tenho certeza). vejo gente nas ruas, gente fazendo ativismo nas redes, gente se zombando, gente apanhando, gente batendo. isso tudo bota mais uma carta no castelo de angústia e eu fico pensando que essa é uma sensação e uma situação do baralho. ba-dum-tss.
se eu olho pro mundo de antes e o mundo de depois, parece que a clareza do que precisamos fazer só diminui conforme a gente compreende mais as estruturas que estão ao nosso redor. e a gente que era um pontão vira um pontinho, quase invisível no espelho. precisa de lupa pra enxergar nossos braços balançando e gritando "olha eu aquiiiiiiiiiiiiiiii!".
mas tudo bem. nos foi dada a graça da condição humana, então, enquanto eu primavero-me, tento rir — pra não explodir em um quadrilhão de micropedaços e virar poeira cósmica, já que tiro, borracha e bomba não tem faltado ultimamente.
ainda não inventei a tal da calculadora… mas pra quê se o pascal já fez isso pra mim? não só pra mim como pra toda a humanidade. eu hein. fico tentado a ressignificar aquele dia e pensar que foi um estímulo, para que eu, enquanto pessoa, me sentisse desafiado a criar algo, sair do arroz-com-feijão que poderia ser minha vida. bom, aqui to eu fazendo uma jornada baião-de-dois — se comer e andar no sol, dá indigestão.
e é isso. um grande ciclo. um sem fim de "o que", "como" e "porque". andar de carro e trocar a roda ao mesmo tempo. engolimento agudo de sapo. happy hour. horário de pico. publicação de artigo. "e as namoradinha?". impeachment. breakeven. burocracia. dor de cabeça. "cê tá sumido". chamada no skype. comida de mãe. conselho de amigo. sambalelê. gestão de crise. gestão de crista.
de pouquinho em pouquinho, a marca vai ficando. assim espero eu. pode ser impressão, pode ser síndrome de estocolmo. ou não.
espero que não.